Celebramos nesta segunda-feira (29/11) o Dia Internacional de Solidariedade com o Povo Palestino, data instituída para lembrar o direito a autodeterminação dos palestinos.
Na busca pelo fortalecimento da memória sobre a população palestina e pelo compromisso de solidariedade assumido pela Organização das Nações Unidas (Onu) a respeito desta população, esta data é carregada de memórias e significados para toda a comunidade internacional, que entende a luta palestina como uma questão transfronteiriça.
Origem e contexto
O contexto da criação do Dia Internacional de Solidariedade com o Povo Palestino se dá em 1947, onde a Onu, composta por 57 nações, realiza uma votação a respeito da divisão da Palestina. O resultado da votação foi favorável à fragmentação do território em dois Estados (Palestina e Israel), onde 56% da área passaria a pertencer ao povo israelense, e o restante ao povo palestino. Na fundação de seu Estado, Israel, por meio da força, passou a ocupar 78% do território, promovendo a expulsão dos palestinos de suas terras designadas. A partir daí os palestinos passaram a se refugiar em acampamentos na Cisjordânia, Gaza, Líbano, Jordânia e Síria. Em 1967, O Estado de Israel se apossou do restante do território que, por determinação da Onu, pertencia à instauração do Estado Palestino.
Dez anos mais tarde, em 1977, a Assembleia Geral da Onu determinou, através da Resolução 32/40 B, que o dia 29 de novembro passasse a ser celebrado como Dia Internacional de Solidariedade com o Povo Palestino.
Apesar da partilha do território palestino ter dado início a um dos maiores conflitos relacionado à autodeterminação dos povos que conhecemos, o conflito entre Israel e Palestina antecede a resolução da Onu a respeito do tema. O embate entre esses dois Estados remonta os anos finais do século XIX e início do século XX, período marcado por grandes eventos históricos como o Movimento Sionista, a incompatibilidade tecnológica do Império Otomano com aquele momento e o fim da Primeira Guerra Mundial.
A partir daí, tivemos diversos acordos contraditórios sobre as pretensões dos povos árabes e judeus, como a Declaração de Balfour e a Correspondência Hussayn-McMahon, assim como convenções veladas entre a França e Inglaterra sobre os territórios do Império Otomano – Acordo de Sykes-Picot – que foi encerrado com a assinatura do Tratado de Sèvres em 1920. Todos esses acordos e ações mascaram o contexto neocolonial daquele período.
Após a Segunda Guerra Mundial, o cenário político tendeu à posição judaica, impulsionada pelo holocausto e como fruto de negociações sionistas perante as grandes potências globais. O resultado de tudo isso foi a partilha do território palestino, que até aquele momento, estava sob controle do governo britânico, consequentemente tendo a instituição do Estado Judeu.
Na guerra de 1948, forças árabes compostas por milícias palestinas, o Exército de Libertação Árabe (Jaysy Al Inqadh) da Liga Árabe e soldados dos exércitos do Egito, Síria, Iraque, Jordânia, Líbano e Arábia Saudita se reuniram na tentativa de dar uma resposta à declaração de independência de Israel. Porém, Israel estava amparado pelos militares da Hagana, forças paramilitares da Irgun (Etzel) e Stern Gang (Lehi) e como apoio crucial à batalha, a Palmach.
Diante de tamanha disparidade de contingente, a vitória israelita era óbvia, juntamente com o alargamento do território de Israel para além do que havia sido determinado pela Resolução da Onu sobre a repartição das terras. Para a Palestina, esse conflito recebeu o nome de “Al-Nakba”, que significa “A Catástrofe”. O nome atribuído pelos palestinos a esse conflito se refere a todo o período desde a saída e expulsão do seu território, até os acontecimentos que afetaram os palestino entre dezembro de 1947 a janeiro de 1949. Cerca de 800 mil palestinos deixaram suas terras ou foram expulsos de suas casas, o que significa algo em torno de 50% de toda a população palestina.
Em seguida, com a Guerra dos Seis Dias, em 1967, Israel conquistou diversos territórios que pertenciam à Palestina, como Cisjordânia, Gaza, Jerusalém Oriental, Colinas de Golã e Península do Sinai. Além disso, em 1964, a Liga Árabe criou a Organização de Libertação da Palestina (OLP). Alguns anos depois da criação, a partir de dissidências internas outras organizações com caráter socialista foram criadas.
Dessa forma, tendo em vista as tentativas de acordos que deram errado, a ineficácia da OLP, a falta de ajuda internacional, os constantes descumprimentos das resoluções da Onu por parte de Israel e os abusos cometidos pelos israelenses, a população que residia nos territórios palestinos que foram dominados por Israel se revoltaram e começaram a fazer protestos e greves em 1987, dando início à Primeira Intifada. Os protestos foram feitos por uma população civil que não tinha muitas armas e recursos, levando à morte de mais palestinos do que israelenses. Tal conjuntura contribuiu para o surgimento dos Acordos de Oslo, entre Israel e a OLP, firmados entre 1993 e 1995.
Contudo, os acordos não resolveram o conflito e acabaram aumentando a ocupação israelense na Palestina. Com isso, desde os anos 2000, Israel demoliu milhares de casas, desabrigando os palestinos, nos territórios da Cisjordânia e Gaza. Além disso, eles construíram muros na Cisjordânia e em Jerusalém Oriental em resposta à Segunda Intifada (que ocorreu de 2000 a 2005), o que causou milhares de mortes de ambos os lados. Tal medida isolou cidades e segregou a população, acarretando na violação dos direitos da população no que diz respeito à locomoção e acesso à serviços essenciais à vida humana.
Com a retirada de Israel em 2005, dois anos depois a Faixa de Gaza passou a ser dominada por um grupo de palestinos. Tendo isso em vista, Israel reforçou a vigilância nas fronteiras dos territórios que estavam sob seu domínio e realizou três invasões em 2008, 2012 e 2014.
A permanência de políticos conservadores no poder tem acelerado o desenvolvimento de projetos sionistas de anexação de terras palestinas, o que dificulta ainda mais as possibilidades de diálogo, minando a solução de dois Estados, princípio norteador tanto em Oslo quanto em negociações posteriores. O decurso do tempo pesa contra a população palestina, cujas condições de vida são diuturnamente aviltadas, sem alternativas ante a ocupação israelense. É preciso destacar que os prejuízos também são sentidos pela população israelense, posto que a falta de diálogo entre as lideranças adia as perspectivas de uma vida menos militarizada, belicosa e violenta.
Dessa maneira, percebe-se que o conflito continua e a população tanto palestina quanto israelense sofre com essa conjuntura. Vale destacar que, em 2020, Donald Trump anunciou a criação de uma proposta que terminaria com o conflito entre Israel e Palestina. Nesta proposta, indo contra o Direito Internacional, estava previsto que as terras do Vale do Rio Jordão, pertencentes à Palestina, e Jerusalém seriam “dadas” a Israel. Esse documento evidencia a interferência norte-americana que visa atender seus próprios interesses. Outro ponto importante é que Israel tem buscado estabelecer relações amigáveis com os países Árabes, com o intuito político de isolar a Palestina. Isso se comprova, por exemplo, com o acordo de paz entre Israel e os Emirados Árabes Unidos, em setembro de 2020 e os acordos com o Sudão e Bahrein.
Anualmente, diversas iniciativas e eventos organizados pela Onu e por outras organizações da sociedade civil acontecem com o intuito de trazer o olhar global para o povo palestino. Em 2020, por causa da pandemia da COVID-19, a Onu incentivou o uso das hashtags #Rights4Palestine e #PalestineDay nas redes sociais de forma simultânea com as manifestações que incluem atos culturais. De acordo com a Agência das Nações Unidas para Assistência aos Refugiados Palestinos (Unrwa), a pandemia impactou muito as contribuições de assistência internacional ao povo palestino, chegando ao seu menor nível desde 2012 e elevando ainda mais uma situação que já é bastante complexa.
A existência do Dia Internacional de Solidariedade com o Povo Palestino em 29 de novembro é útil para que todos se mobilizem e se sensibilizem globalmente para com o povo palestino, que carrega um grande histórico de perdas e violações sofridas. Porém, a luta pelo direito a autodeterminação e todas as demais garantias estabelecidas pelo Direito Internacional para com todos os povos, incluindo o povo palestino, precisa ser diária e encarada como uma questão que transcende fronteiras, culturas e quaisquer barreiras internacionais.
* Com informações da Revista Relações Exteriores