Comunidade da UnB promove ato de resistência ao golpe

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Com o objetivo de fomentar a unidade e a resistência contra o golpe de Estado que se encontra em sua última fase de aprovação no Senado Federal, a comunidade acadêmica da Universidade de Brasília participou de mais um debate no último dia 12. Dessa vez, os estudantes, professores, funcionários, técnicos administrativos e demais setores que fazem parte da UnB tiveram a oportunidade de dialogar com o jurista, advogado e magistrado espanhol Baltasar Garzón, conhecido por todo continente europeu pela prisão do ditador chileno Augusto Pinochet, além de outras lideranças que enfrentaram de perto do processo de ruptura democrática, como o ex-ministro da justiça Eugênio Aragão.

Não foi a primeira visita política de Baltasar Garzón ao Brasil. O jurista esteve presente em outros importantes momentos da história do país, como no debate sobre a Lei da Anistia e sua aplicação para torturadores, no enfrentamento pela implantação do Programa Nacional dos Direitos Humanos-PNDH e na implantação da Comissão Nacional da Verdade.

“Tenho acompanhado o povo brasileiro e como homem de direito acredito que existe uma grande confusão nesse país. Temos pessoas que não são amigas da democracia, se apoiando na democracia para justificar ações inconstitucionais. Estamos diante de um autêntico golpe institucional de Estado. Pude acompanhar o discurso de Dilma Rousseff e se tratou de uma declaração dolorosa, contundente e combativa, que expressa uma dor profunda de uma pessoa que foi injustamente afastada do cargo que o povo brasileiro lhe confiou nas eleições. Estou perplexo, surpreendido e sem entender nada”, afirmou Baltasar Garzón.

O jurista também afirmou que nem a Câmara e nem o Senado possuem legitimidade para julgar Dilma Rousseff, pois o parlamento tem números altíssimos de pessoas ligadas a crimes de corrupção, na contramão da presidenta que sempre se mostrou combativa ao lidar com esse mal. Baltasar afirmou ainda que falta transparência e informação nesse processo. Vemos um êmbolo de informações carregadas de interesses políticos, econômicos. Desde a campanha presidencial pudemos perceber isso, quando revistas de tiragem nacional estamparam notícias falsas sobre a presidenta às vésperas do processo eleitoral, mostrando interesse de diversas corporações no afastamento de Dilma Rousseff. Em qualquer caso de impeachment comum, o correto seria aprofundar as investigações antes de levar o processo para votação. Temos como cidadãos, o dever de impedir o que parece uma epidemia nesse continente, a ruptura das democracias”, explica o jurista.

Desafios do universo acadêmico
Para Mauro Mendes, coordenador geral do Sindicato que representa os técnicos administrativos e terceirizados da UnB (Sintfub), a Universidade é um foco de resistência. “Estamos hoje numa conjuntura em que infelizmente muitos estudantes não têm esse posicionamento e parte dos funcionários e professores está na mesma situação. O nosso dever é conscientizar toda a comunidade acadêmica que o que está em jogo não é a retirada da Dilma ou a retirada do PT mas todos os projetos de avanço da sociedade, inserção das cotas na Universidade, e a democracia”.

Mauro Mendes acredita que a educação será afetada negativamente com o projeto de governo golpista que ficará em vigor por até 180 dias antes do próximo julgamento. “Tivemos péssimas experiências com o governo neoliberal de FHC, onde houve congelamento brutal de salários para a educação, várias iniciativas privatistas, além de desemprego e miséria alarmantes. Todos os avanços que tivemos nos últimos 12 anos para a educação e para a universidade estão sendo jogados na lata de lixo com a aprovação desse impeachment. É importante mobilizar a comunidade acadêmica, professores, novos alunos, técnico-administrativos e deixar claro que além desse golpe acabar com a democracia no nosso país, ele retirará, na sequência, direitos da classe trabalhadora e atingirá diretamente os servidores públicos, afetando a pesquisa, o ensino e a extensão. Se a gente tinha uma grande luta pela defesa da Universidade, a autonomia e a redemocratização da nossa instituição de ensino, agora será muito mais. O momento é de reflexão e unidade; não dá mais pra discutir apenas as lutas e pautas internas da Universidade; temos que nos engajar seriamente nessa luta”, afirma o coordenador-geral do Sintfub.

Rede de fascismo
O ex-ministro da Justiça Eugênio Aragão realizou uma análise do tempo em que vivemos, relacionando as novas tecnologias com o caráter golpista de uma série de mobilizações antidemocráticas. Para Eugênio, esse ciclo teve início em 2013, quando as massas começaram a ir às ruas convocadas pelas redes sociais e sem uma pauta específica. “Aquela grande mobilização teve início com as revindicações do Movimento Passe Livre de São Paulo contra o governo do Estado, que por sua vez reprimiu duramente o movimento. Ao se espalharem pelo país, as manifestações foram ganhando uma dinâmica própria e englobando pessoas com as mais variadas intenções, nem sempre democráticas. Quando acabaram, as jornadas atingiram em cheio a popularidade da presidenta Dilma, que antes tinha invejáveis quase 70% de aprovação por parte da população e depois caiu pra cerca de 30%”, explica Aragão.

Para o ex-ministro, a dinâmica das redes sociais é diferente e permite a manipulação de forma mais rápida com textos curtos e informações distorcidas. “A rede é altamente perigosa e acaba revelando o lado mais perverso das pessoas por causa da impunidade e da impessoalidade do processo comunicativo. Na rede, os indivíduos podem rir das piadas machistas, racistas e homofóbicas, tendências que já estavam sendo rejeitadas socialmente, no contato olho no olho. Abriu-se a caixa de pandora e ela afetou diretamente as agendas democráticas, progressivas e libertárias, que estavam num momento de reação histórica. Saíram do armário os preconceitos, a intolerância. A esquerda ainda não tinha aprendido a lidar com esse novo espaço e as forças mais reacionárias da sociedade já estavam a par do poder desses espaços”, afirma Eugênio Aragão.

“A mobilização da sociedade civil é absolutamente necessária nesse momento. Por isso, a união dos sindicatos, estudantes, professores, universidades, movimentos sociais, devem cobrar do Senado que se atenha às denúncias de crime contra Dilma Rousseff. Se isso acontecer, ela está absolvida ou vamos ter que começar a aceitar que os argumentos são a última coisa que valem nesse processo”, explica o ex-ministro da Justiça.

Fonte: CUT Brasília

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